Os nematoides fitoparasitas são vermes microscópicos que vivem nos solos e atacam as plantas, causando sérios prejuízos ao produtor. Os danos dependerão da espécie presente na área e do nível de infestação.
No Brasil, para as culturas de grãos, os mais importantes têm sido nematoides de cisto da soja (Heterodera glycines, raças 1, 2, 3, 4, 4+, 5, 6, 9, 10, 14 e 14+), nematoide das lesões radiculares (Pratylenchus brachyurus), nematoide das galhas (Meloidogyne javanica e M. incognita) e nematoide reniforme (Rotylenchulus reniformis).
De acordo com a Sociedade Brasileira de Nematologia, as perdas anuais provocadas pelos nematoides são da ordem de R$ 35 bilhões no Brasil. Apenas na produção de soja, as perdas são estimadas em R$ 16,2 bilhões.
Na definição de quaisquer medidas de manejo visando a redução de perdas, é fundamental que o produtor conheça quais nematoides estão presentes em sua área e os níveis populacionais. Para isso, as análises nematológicas são fundamentais.
Importância das análises nematológicas
O diagnóstico de nematoides é realizado a partir de uma boa análise nematológica. Este deve ser o mais preciso possível, pois as decisões a serem tomadas no campo dependerão dos resultados emitidos pelo laboratório. As análises nematológicas determinam os gêneros, espécies, raças e seus níveis populacionais no solo e nas raízes.
Muitas vezes o produtor não percebe a presença do nematoide na área, pois são seres invisíveis a olho nu. Entretanto, sua incidência começa a ser evidenciada a partir dos sintomas que as plantas demonstram nas lavouras.
As análises nematológicas podem auxiliar o produtor a decidir pela melhor ferramenta de manejo. Em situações com altas populações de nematoides, deve-se optar por ferramentas drásticas, como por exemplo, o cultivo de culturas de cobertura imunes às espécies diagnosticadas, rotação de culturas, cultivares resistentes ou que apresentam baixo fator de reprodução, controle químico e biológico.
Por sua vez, para se obter um diagnóstico preciso dos nematoides, o produtor deve conhecer e executar corretamente os processos básicos de amostragem, preparo, acondicionamento e envio das amostras ao laboratório.
Quando e como proceder a amostragem em grandes culturas?
Para grandes culturas, a época recomendada para a coleta de amostras é no período de florescimento. Em casos de plantas perenes e hortaliças, as recomendações são outras.
Em áreas onde não se percebe manchas ou reboleiras do nematoides, recomenda-se o caminhamento em “zigue-zague”, coletando no mínimo 10 subamostras para cada 30 hectares. Ressalta-se que quanto maior o número de subamostras, mais preciso e confiável serão os resultados das análises.
A Figura 1 ilustra um mapeamento georreferenciado de populações de P. brachyurus em raízes de soja, onde é possível verificar que a sua distribuição é irregular no talhão (picos populacionais distintos nos pontos amostrais).
Figura 1. Mapeamento georreferenciado de Pratylenchus brachyurus em raízes de soja na safra 2019/2020. Fonte: Rayane Gabriel da Silva.
O mapeamento georreferenciado de populações de nematoides é de suma importância para o seu manejo cultural, pois o produtor pode estabelecer estratégias de redução do tráfego de máquinas e equipamentos, deixando as áreas mais infestadas para serem manejadas por último.
Em áreas com presença de reboleiras (Figura 2), as amostras devem ser coletadas nas margens/bordas (área de expansão das populações). As plantas mais ao centro da reboleira devem ser coletadas separadamente, constituindo dois tipos de amostras.
Figura 2. Lavoura de soja com reboleiras provocadas por altas populações de M. incognita. Foto: Rayane Gabriel da Silva.
O que coletar?
A maioria dos gêneros de nematoides são encontrados em grandes quantidades nas raízes, devido ao seu hábito de parasitismo. Alguns deles são endoparasitas sedentários, como o nematoide das galhas (Figura 3).
Figura 3. Raízes de soja com sintomas severos de presença de nematoide das galhas. Foto: Iryana Viana.
Embora seja comum as raízes apresentarem maiores níveis populacionais de nematoides do que o solo, as quantidades de ambos a serem enviadas ao laboratório devem ser suficientes para determinar as populações. Do contrário, a análise ficará com informações incompletas e o diagnóstico da real situação da área será comprometido. Infelizmente, a quantidade insuficiente de raízes tem sido um erro amostral frequente (Figura 4).
Figura 4. Amostras recebidas no laboratório com quantidade insuficiente de raízes. Foto: Rayane Gabriel da Silva.
Na Tabela 1 são apresentados resultados que revelam a importância do diagnóstico de nematoides nas raízes. Em um único talhão foram coletadas três amostras de solo e raízes em reboleiras distintas para quantificação de P. brachyurus. É possível verificar que a população do nematoide no solo não foi expressiva, como foi nas raízes.
Portanto, se o produtor observar apenas os resultados de solo, certamente deduziria que as amostras coletadas estariam com populações similares nas raízes; ou então, por ser um número baixo no solo, essa população não estaria causando danos. Mas não é isso que acontece na prática. A análise de raízes revelou que as amostras 2 e 3 apresentaram populações de P. brachyurus 2,5 e 3,6 vezes maiores, respectivamente, que a amostra 1; no solo, nesse mesmo comparativo, a diferença foi de 1,7 e 1,9 vezes. Estes resultados mostram o quão é importante os resultados de raízes nas análises nematológicas.
Tabela 1. Populações de Pratylenchus brachyurus em amostras de solo e raízes de soja coletadas em reboleiras no mesmo talhão.
Amostra | Solo | Raízes | |||
100 cm3 | Diferença | 10 g | Diferença | ||
1 | 100 | – | 6.900 | – | |
2 | 170 | 1,7 vezes | 17.540 | 2,5 vezes | |
3 | 190 | 1,9 vezes | 24.760 | 3,6 vezes |
Fonte: Rayane Gabriel da Silva.
Para o nematoide de parte aérea Aphelenchoides besseyi, causador da “soja louca II” e “superbrotamento” no algodão, recomenda-se coletar plantas com sintomas aparentes (Figura 5).
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Figura 5. Plantas de soja com sintoma de bolhas no limpo foliar e aspecto chicote típico de “soja louca II”. Fotos: Rayane Gabriel da Silva..
Quanto coletar?
As quantidades necessárias para as análises no laboratório são de aproximadamente 50 g de raízes e 0,5 kg de solo. Para análises específicas, como o teste de raça de cisto e espécie de Meloidogyne spp., o produtor deve enviar 5,0 kg de solo.
Cuidados a serem tomados
A maioria dos nematoides tem preferência por parasitar as radicelas. Portanto, nunca se deve coletar as plantas simplesmente puxando-as, pois este procedimento faz com que as radicelas se rompam, ficando no solo.
Outro aspecto importante é a umidade do solo, que deverá estar apresentando sua umidade natural. O responsável pela coleta deve evitar a amostragem em condições extremas: condições de chuva, umidade elevada, solo encharcado e solo ressecado no qual formam torrões (Figura 6).
Figura 6. Amostras recebidas no laboratório com solo ressecado e presença de torrões. Foto: Rayane Gabriel da Silva.
Após a coleta, as amostras devem ser embaladas e deixadas em local arejado e/ou climatizado. As amostras nunca devem ser acondicionadas em congelador ou freezer, pois esta prática prejudicará e danificará irreparavelmente a amostra para análise. Caixas térmicas e de isopor são indicadas somente para o acondicionamento das amostras durante o transporte ao laboratório.
Prática indispensável
A análise nematológica é notoriamente fonte para o diagnóstico correto, uma vez que a simples observação de sintomas no campo não traz informações que subsidiam as tomadas de decisões quanto ao manejo de nematoides. Contudo, é fundamental que o responsável atenda as informações aqui mencionadas para uma correta amostragem.
É importante também que as amostras sejam enviadas para um laboratório confiável e com profissionais qualificados, pois a identificação de gêneros, espécies e raças requer anos de experiência em nematologia agrícola.
O valor financeiro da análise deve ser encarado como investimento e não despesa, pois o nematoide é oculto no solo e quando ocorre a presença de sintomas na lavoura, certamente parte da produção já foi acometida.
Publicado na Revista Campo & Negócios, (ISSN 2359-5329), Uberlândia – MG, ed.224, p.6-8, novembro/2021.
autores:
Rayane Gabriel da Silva
Engenheira agrônoma, mestra, pesquisadora e nematologista - NemaBio Laboratório e Pesquisa Agronômica
Claudinei Kappes
Engenheiro agrônomo, doutor e
pesquisador em Fertilidade do Solo e
Adubação - NemaBio Laboratório e
Pesquisa Agronômica